quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

Morte - 5 de Espadas

Velha conhecida de todos os que lidam com cartas divinatórias, a Morte simboliza o Fim, mas seguido de um novo começo. A cultura ocidental desenvolveu verdadeiro pavor dessa Passagem, talvez pela descrença cristã na reencarnação, o que nos daria apenas uma vida para colocar tudo em pratos limpos a fim de merecer o Reino dos Céus. O fim do prazo nos exaspera, pois depois do gongo final não haveria mais chance. Além disso, a peste bubônica espalhou pânico pela Europa, e o contato com a morte - apesar de cotidiano e abundante - só aumentou o medo da Ceifadora. O Anjo da Morte e a Dança da Morte são temas comuns na arte da época. A Morte e sua foice cortando qualquer esperança, trazendo o desespero e até mesmo o questionamento sobre o Amor Divino. Pois se Deus é inteiramente Bom, como permitiria tamanha injustiça, cortando o tempo na Terra e diminuindo assim as chances de se fazer o Bem, de pagar os pecados e morrer completamente limpo? Tal abalo foi responsável pela passagem de uma sociedade de uma Era a outra. A peste mudou a Europa e, indiretamente, o mundo. E é esse o efeito desse Arcano: a mudança.

A imagem da Sibilla Della Zíngara é implacável: o Anjo da Morte procura sua próxima vítima. Carrega a foice - seu instrumento de trabalho - em uma mão, e um crânio na outra, como um troféu. As cartas ao lado mostrarão o que está sendo cortado. Essa figura faz alusão à Foice do Lenormand, e reforça seus significados: corte, fim necessário e inevitável, colheita.

Já a Vera Sibilla Italiana tem uma imagem que me causou muito assombro: um caixão apoiado por duas
cadeiras eu uma vela enorme cujo fogo abundante provoca uma fumaça considerável no ambiente fechado. A cena parece saída de um livro do século XIX, com o seu ar macabro e sufocante. Quase podemos sentir o cheiro da cera derretida misturada à decomposição. As cadeiras mostram um arranjo improvisado, remete-nos aos velórios feitos em casa e regados a café e biscoitos, atraindo a vizinhança morbidamente curiosa. 

Vi um velório desses uma vez, em Curitiba, na casa vizinha à da minha bisavó. A sensação de trazer a morte para dentro de casa assusta, mas também a transforma a nossa percepção e nos obriga a enxergá-la em sua proporção real. A morte é parte da vida, e devemos integrá-la. 

A imagem da Vera Sibilla é semelhante ao Caixão do Lenormand, que significa transformação, transmutação. Representa o primeiro estágio alquímico - nigredo - a morte espiritual. Nigredo significa "escuro", é o estágio da putrefação da matéria que se torna fertilizante para um novo nascimento. Não é possível chegar à iluminação, o último estágio, sem morrer primeiro.

A decomposição de uma situação que não se sustenta mais. Em vez de lamentar-se sobre o horror dessa decomposição, devemos vê-la justamente como esse fertilizante. Esses componentes decompostos e rearranjados trarão à luz um novo ser, um novo espírito. 

O luto não é o foco desse arcano: ele é mais presente na carta Il Vedovo. O foco é o fim e a transmutação. É uma carta de esperança, na minha opinião. De crescimento real.





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